quinta-feira, 7 de abril de 2011

CONVERSAS COM S.A.R., DOM DUARTE DE BRAGANÇA E REI DE PORTUGAL

 "Ainda hoje pergunto, porque é que Cabinda, que tem uma cultura própria bastante avançada, especifica, e uma consciência nacional das mais apuradas que há em África, porque é que Cabinda e os Cabindas haviam de ser um mero distrito de Angola?"
- Mas que forma poderia revestir uma ligação final de Portugal a estes territórios?
Dom Duarte - Sou dos que pensam que houve em Portugal, além de outros, um erro fundamental no que respeita ao ultramar: foi o de considerar "o problema ultramarino" como único e indivisível. Ora acho que, pelo contrário, havia tantos problemas quantos os territórios do ultramar! Havia que resolver caso por caso, sem se considerar (como foram a doutrina e a política oficial), que a "negociação" com o "adversário" numa frente de guerra destruiria moral e politicamente os fundamentos da posição portuguesa e até a sua capacidade de lutar noutros territórios.
Posso, é evidente, estar enganado. Mas, desde muito novo acreditei que era necessário resolver cada caso por si. E, note, sempre pensei que haveria que encontrar soluções específicas, até dentro das grandes unidades geopolíticas.
Ainda hoje pergunto, porque é que Cabinda, que tem uma cultura própria bastante avançada, especifica, e uma consciência nacional das mais apuradas que há em África, porque é que Cabinda e os Cabindas haviam de ser um mero distrito de Angola? E outros exemplos se poderiam encontrar: a ideia de considerar que a Guiné e Cabo Verde constituíam "um todo", era por tal forma contrária às realidades que não resistiu à pressão das mesmas! Nesse período da minha juventude passado em Angola, no serviço militar, que procurei cumprir da forma mais correcta que me foi possível, não deixei de me preocupar continuadamente com uma perspectiva ampla que não passava manifestamente pela ideia de uma vitória militar a todo o custo.
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(....) a matéria. Assiste ao povo de Timor, como as Nações Unidas já reconheceram, inquestionável direito à autodeterminação. Tenho-me batido sistematicamente, e na modesta dimensão das minhas possibilidades, para que esse direito possa ser exercido. Pessoalmente estou convencido de que podendo autodeterminar-se, existiria uma possibilidade de os timorenses optarem por manter uma ou outra forma de ligação a Portugal.
Como sabe as grandes potências coloniais de outrora, mesmo depois da descolonização, continuaram a administrar (sublinho: por vontade das próprias populações), múltiplos territórios através do mundo. Lembre-se do ministério francês popularmente chamado "dos Dom-Tom", (abreviatura das expressões "Département d'Outre Mer/Territoires d'Outre Mer").
-Acha que, se a descolonização o tivesse permitido, poderia haver hoje "Dom-Toms "portugueses?
Dom Duarte - Pelo menos nos territórios onde não havia guerra, a autodeterminação poderia ter conduzido a soluções de articulação com Portugal (como aconteceu com tantos outros ainda sob administração francesa, americana, holandesa, etc.). Acho que quanto a este ponto se reflecte, de novo, a circunstância de se ter tratado do problema do ultramar como "um todo", sem ter havido a subtileza de se entender (antes ou depois da revolução), que cada território merecia uma consideração calma, ponderada e específica.
A construção encontrada para os Açores e para a Madeira, que são Regiões Autónomas com órgãos políticos e administrativos próprios dentro da unidade nacional, poderia, porventura, ter sido aceite pelo povo de Cabo Verde? Certamente pelo de Timor? Quem sabe se pelo de São Tomé? Quem sabe se pelo de Cabinda (se tivesse havido a coragem de considerar Cabinda como uma entidade diferente de Angola)? Enfim, sobre a descolonização também se tem falado "milhares de horas" e nem eu tenho opiniões particularmente originais. As que aqui manifesto correspondem apenas a uma síntese. São sinceras e estaria pronto a debatê-las em qualquer instância. Acrescento apenas que a Monarquia poderia ajudar, (.....).
Declaração sobre Cabinda (2001)
Numa recente declaração pública, os responsáveis da Frente de Libertação de Cabinda (FLEC), apelaram para que várias entidades portuguesas, entre as quais fui incluído, assumissem uma posição de medianeiros em relação ao sequestro de portugueses em Cabinda.
Desde há muitos anos que venho acompanhando o drama do povo de Cabinda, cujas autoridades tradicionais, no Séc. XIX, assinaram com Portugal o Tratado de Simulanbuco. Por esse Tratado, reconhecido pela Conferência de Berlim como um tratado de Direito Internacional, Cabinda tornou-se um Protectorado Português, segundo as regras bem definidas. Entre outras, o Governo português comprometia-se a não alterar unilateralmente essas regras, nem os limites geográficos do território.
A integração de Cabinda em Angola, para efeitos administrativos, vem de longa data, mas a independência Angolana não podia abranger Cabinda sem o consentimento da sua população em vista do acordo que estava na origem da presença portuguesa nesse território.
Infelizmente, em 1975, por ocasião do acordo de Alvor, Cabinda foi tratada como qualquer outra parte de Angola, sem contemplações para a sua especificidade e sem se dar atenção aos protestos dos líderes de Cabinda. Compreendo, por isso, a delicadeza do assunto.
Embora com limitações resultantes dos factos e das circunstâncias, entendo que Portugal não pode ficar isento das suas responsabilidades perante a História e perante um povo que a nós confiou a sua protecção. A situação do povo de Cabinda tem semelhanças com a situação vivida pelo povo de Timor competindo a Portugal encontrar uma solução para o problema, em colaboração com Angola, recorrendo às instâncias que melhor se posicionem para conciliar as aspirações e interesses das partes envolvidas, e, se necessário, assumindo junto da ONU e da OUA a falta cometida durante a chamada descolonização.
Pessoalmente tenho recomendado aos responsáveis pela luta de libertação de Cabinda, que encontrem uma solução negociada com Angola; mesmo que para tal tenham de sacrificar alguns interesses económicos ou ideais políticos. De igual modo, também tenho apelado ao Governo de Angola, para que trate esta questão com o conhecimento histórico, humanidade e flexibilidade que a sua experiência já permite.
Faço aqui também um apelo para que a FLEC não ponha em risco a saúde e a vida dos prisioneiros, respeitando a Tradição do Povo de Cabinda que sempre ajudou e protegeu os seus irmãos portugueses; a esses homens, em particular, não são imputáveis responsabilidades pelas atitudes dos Governos de Portugal e Angola, e a sua morte, por doença ou devido aos combates, só iria beneficiar os vossos inimigos.
No que me diz respeito, mantenho a minha disponibilidade, se for entendida como útil a minha participação, e não quero esquecer as provações por que passam as famílias dos que se encontram retidos em Cabinda.
Dom Duarte de Bragança
Rei Legitimo de Portugal

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